Como implantar uma estrutura de remuneração na sua empresa ?

COMO IMPLANTAR UMA ESTRUTURA DE REMUNERAÇÃO NA SUA EMPRESA?

Obviamente não tenho a pretensão de resumir em poucas linhas deste artigo o conteúdo do meu livro publicado pela Editora STS em 2006 e tampouco do curso que ministro há alguns anos, ambos com o mesmo título, mas gostaria de esboçar rapidamente os principais passos do processo de implantação, deixando os detalhes para um momento mais oportuno.
Independente do tamanho ou complexidade da empresa sete são as etapas para esse objetivo:
1) Comunicação do projeto
2) Levantamento e descrição dos cargos
3) Análise dos cargos
4) Pesquisa salarial
5) Avaliação dos cargos
6) Classificação dos cargos
7) Elaboração das faixas salariais

1) COMUNICAÇÃO DO PROJETO
É surpreendente como muitas empresas ou Consultorias não dão importância a esta primeira etapa do processo: simplesmente desprezam a oportunidade ou abordam o assunto o mínimo possível. Esquecem elas da enorme expectativa e ansiedade que a simples menção do nome do projeto venha causar.
Costumo exemplificar, para justificar essa etapa, com a possibilidade de duas decorrências da não observação dessa etapa e ambas podem não condizer com a realidade: se o momento da economia ou da empresa for bom a expectativa é de aumento salarial generalizado, não inferior a um dígito; se o quadro for inverso (crise, perda de mercado, recessão, etc.) há o medo do corte indiscriminado.
A comunicação do projeto é fundamental não apenas para eliminar os boatos, que podem tornar a vida do profissional responsável pelo trabalho um inferno, como, também, orientar a coleta de informações. Aspectos como a necessidade de uma melhor consistência na organização dos cargos, padronização da titulação, definição correta dos perfis dos cargos para efeitos de carreira e treinamento, etc. devem ser enfatizados bem como a forma de contribuição dos funcionários no levantamento de informações (preenchimento dos questionários para identificação dos cargos, entrevistas, observações “in loco”, etc.). Um título discreto para o projeto também ajuda.
Definido o que falar, mãos à obra! Qualquer comunicação é melhor que nada – reunião com os Gestores para explicação do projeto, comunicações no mural, material ilustrado (para o apresentador, não há dúvidas, mas nada melhor que o “olho no olho” e o respeito que a empresa passa ao importar-se com cada funcionário e não apenas com seus líderes.
2) LEVANTAMENTO E DESCRIÇÃO DOS CARGOS
Vamos desde já esclarecer um ponto: levantamento e descrição de cargo não se confundem, não são a mesma coisa. O levantamento do cargo é a abordagem inicial do cargo através do próprio ocupante ou do Gestor deste e se processa através do preenchimento do formulário ou questionário de coleta, observações no local de trabalho ou simples entrevista. As duas últimas opções são, quando aplicadas isoladamente, frágeis e superficiais e, portanto, devem sempre complementar a coleta de informações feita por um documento escrito.
Para facilitar a vida do ocupante do cargo a ser descrito é melhor orientá-lo pedindo que responda sempre o que é feito, por que e como para cada atividade. Com isso evitam-se levantamentos muito sucintos (“opero o torno”, por exemplo) ou detalhados (“chego na empresa, me troco, tomo o café, bato o ponto e vou trabalhar”, por exemplo) que apenas alongam essa etapa.
Dificilmente apenas o preenchimento do formulário é suficiente para conhecer-se o cargo: entrevistar o ocupante para dirimir dúvidas, informar-se sobre o fluxo da rotina, observar o equipamento e condições de trabalho é fundamental para elaborar-se uma boa descriçã“gibis”) ou, na minha opinião, a melhor de todas: reuniões com todos os funcionários. Desgastante o.
Enquanto o levantamento é material bruto, com estilo e detalhamento variados, apesar das orientações de preenchimento, a descrição é a formatação padronizada das atividades do cargo: exige-se a mesma sequência, estilo de redação, distribuição dos tópicos, etc. Talvez seja a etapa mais difícil do processo pela aversão que muitos têm pelo hábito da escrita, daí encontrarmos cada vez mais descrições sumaríssimas, que nada revelam.
Uma adequada descrição de cargo deve conter:
a) Identificação do cargo: área e superior imediato
b) Descrição Sumária: breve relato das atividades executadas (dois parágrafos no máximo) para responder simplesmente “esse cargo existe na empresa para que?”
c) Descrição Detalhada: relato sucinto das atividades observando-se sempre o que é feito, por que e como por freqüência de execução (tarefas diárias, semanais, mensais, eventuais, etc.).
Saliente-se que a descrição é do cargo e não da posição. Geralmente tarefas similares que compõem o mesmo cargo embora executadas por ocupantes diferentes devem ser agrupadas numa mesma descrição. Uma empresa, por exemplo, pode ter vários Analistas de RH com funções diferentes (seleção, treinamento, remuneração, etc.), mas com uma única descrição compreendendo todas essas atividades.
3) ANÁLISE DOS CARGOS
Eis o “coração” do projeto. A análise do cargo define o perfil, especificações ou competências de cada cargo que serão quantificadas na etapa de avaliação para atribuir o valor relativo de cada um (ainda não estou falando de salários, mas “pontos” ou outra medida de valor que permita a hierarquização dos cargos).
Geralmente a análise é uma atividade conjunta entre RH ou Consultoria e gestores (sim, pode ser mais de um de acordo com a hierarquia) que, em conjunto e à luz de uma Manual de Análise, decidem o grau de intensidade de cada competência (também chamada de “fator”). Os manuais de análise variam de caso a caso, mas usualmente abrangem fatores como: Preparo Profissional (escolaridade, treinamentos ou habilidades e experiência), Natureza das Tarefas (complexidade e iniciativa), Especificidade do Cargo (facilidade de contratação e nível hierárquico), Condições de Trabalho, Responsabilidade Operacional (riscos e conseqüências dos erros cometidos, acesso a dados confidenciais, contatos pessoais) e Responsabilidade por Orçamento (tamanho da equipe , valor do patrimônio utilizado, impacto nos resultados da empresa).
Registre-se que o Manual pode ser o mesmo independente da empresa, mas raramente a importância ou pesos dos fatores serão iguais em função das características ou cultura de cada empresa. Não há dois manuais exatamente iguais, com a mesma ponderação dos fatores, mesmo para duas empresas iguais (mesmo segmento, porte, origem, etc.) – se isso acontecer, acredite, um deles é falso!
4) PESQUISA SALARIAL
Se a análise dos cargos define a consistência interna dos cargos cabe à pesquisa salarial definir a consistência externa dos mesmos, isto é, como a empresa deve ou quer se posicionar no mercado.
Existem alguns detalhes que cercam a realização de uma pesquisa para embasar a implantação de uma estrutura de remuneração, diferentemente se seu uso é apenas para comparar um ou outro cargo num momento de manutenção das faixas salariais.
Primeiro, uma pesquisa durante o processo de implantação deve compreender apenas os “cargos padrões”, isto é, aqueles cuja comparação das tarefas é quase idêntica, por exemplo: Recepcionista, Operador de Empilhadeira, Secretária, Técnico de Segurança de Trabalho e outros – alguém duvida que esses cargos executam tarefas muito semelhantes entre si ? Segundo, os cargos selecionados para a pesquisa devem cobrir horizontalmente, se possível, todas as áreas (alguns da área de RH, outros de Manutenção, mais alguns da área Comercial, e assim por diante). Terceiro, essa seleção devem cobrir, também, os vários níveis hierárquicos que serão atingidos pela implantação da estrutura (alguns cargos gerenciais, supervisores e líderes, cargos qualificados e outros nem tanto). Quarto, devemos evitar cargos com senioridade distinta do nível Pleno (Seniores ou Juniores, por exemplo) pois os critérios que as empresas adotam para aplicar tal senioridade varia de caso a caso. Acreditem, uma boa pesquisa para o propósito de uma implantação pode incluir, no máximo, 40% do total de cargos da empresa.
Outro ponto importante é a seleção das empresas participantes. É comum que pesquisas sejam feitas apenas dentro do mesmo setor econômico ou ramo, mas será que uma Secretária de Diretoria de uma empresa metalúrgica não serve para uma empresa química? O ponto fundamental na seleção das empresas que comporão o painel da pesquisa é o porte (número de funcionários, faturamento, por exemplo) bem como a localização, embora neste caso a situação varie em função do cargo pesquisado (dificilmente seria importante para uma empresa saber o salário de um Auxiliar de Limpeza em diferentes municípios, pois o funcionário/candidato evitaria o deslocamento, mas já para um Engenheiro de Projetos isso não representaria um problema).
Por último temos a tabulação. É neste instante que a empresa deve definir qual será seu parâmetro no mercado: posicionar-se no ponto médio, 1º. Quartil ou 3º. Quartil? Como os salários da pesquisa definirão a construção das faixas é agora que a Diretoria deve posicionar-se, pois os cálculos que virão a seguir vão “arrastar” essa informação até a fixação da estrutura salarial, a qual pode ser mais ou menos agressiva dependendo dessa opção.

5) AVALIAÇÃO DOS CARGOS
Se a análise dos cargos define o perfil a avaliação o valoriza, quanto mais importante o perfil maior o valor (maior nível de preparo profissional, maior responsabilidade, etc.). O que chamamos de valorizar um cargo não é, ainda, a atribuição de valores salariais (que é uma conseqüência), mas a fixação de um certo padrão, pontos, por exemplo. Para dar confiabilidade à montagem da estrutura é muito importante (eu diria imprescindível) a adoção de métodos quantitativos, objetivos… matemáticos! Infelizmente, pessoal, nós de Humanas temos que conviver com essa habilidade sim!
A pontuação de um cargo segue uma sistemática: pondera-se cada fator ou competência e, com base nos pesos individuais, calcula-se a pontuação de cada grau de intensidade desse fator. Os recursos matemáticos para tal são a Correlação e o Desvio-Padrão, nada que um programa Excel não possa desenvolver.
Configurar uma avaliação de cargos baseando-se em algo objetivo (números, cálculos, fórmulas, equações, etc.) dá consistência ao trabalho, segurança para o Gestor de RH na divulgação dos resultados do projeto (afinal 2+2 será sempre 4 !) , transparência e facilidade para a compreensão do valor relativo de cada cargo por parte dos funcionários.
6) CLASSIFICAÇÃO DOS CARGOS
Se para cada cargo ou total de pontos atribuíssemos um único valor salarial não teríamos nada de ilógico, mas seria pouco prático, pois uma mínima diferença em pontos entre 2 cargos, por exemplo, poderia resultar numa diferença de centavos nos salários, e isso é irracional. Para isso classificamos os cargos em Grupos, assim cargos com pontuação idêntica ou muito próxima pertencerão ao mesmo grupo e, como consequência, terão o mesmo tratamento (mesmo salário, por exemplo).
Não há uma fórmula matemática para definir-se o número adequado de grupos de uma estrutura. Para isso vale uma série de “tentativas-erros” até que a estrutura resultante atenda às exigências de um Plano de Carreira ou a adequação á estrutura salarial que o mercado pesquisado forneceu.
7) FAIXAS SALARIAIS
Para cada grupo ou classe de cargos definimos uma única faixa salarial. Tradicionalmente uma faixa subdivide-se em valores mínimos, médios e máximos ou, ainda, em 1º. Quartil, Ponto Médio e 3º. Quartil. ; às vezes esses três pontos também se subdividem em “steps” ou graus e é comum encontrarmos faixas com 5, 6, 7 “steps” para que possam abrigar ocupantes distintos em função da senioridade, tempo de casa ou como resultado de um processo de avaliação de desempenho.
Nesse desenho, normalmente, o “step” inicial corresponde ao salário de admissão, o seguinte corresponde ao valor pós período de experiência e os demais, até o final da faixa, aos diferentes níveis de avaliação pessoal adotados pela empresa.
Em recente artigo postado no meu site (“Avaliação de Desempenho, Avaliação de Mérito… sua empresa ainda concede aumentos salariais com base nessas ferramentas?”) comentei sobre o gradual abandono das faixas salariais com vários “steps” para abrigar situações pessoais diferentes. Nele, comentei sobre a inconveniência de reajustes reais de mérito quer em função da irredutibilidade do novo valor salarial bem como dos encargos trabalhistas incidentes.
Assim sendo, venho desenvolvendo faixas salariais mais curtas com apenas 3 “steps”: salário de admissão (“step” 1), salário pós experiência (“step” 2) e salário de adequação (“step” 3) que corresponde ao valor de mercado para os cargos do grupo correspondente. Não há mais “steps” de desempenho ou aumento real, pois busco substituir tal prática pela aplicação da remuneração variável: não há problemas se quiser reduzir a remuneração de um ano para outro em função dos resultados da empresa e não há incidência de encargos trabalhistas. O salário, alcançado o ponto médio, não se altera, exceto em casos de promoção ou plano de carreira quando ocorre uma alteração de grupo (movimentação vertical em detrimento da movimentação horizontal).
É claro que isso pode parecer esquisito em função da cultura do “aumento real de salário”, mas, creiam, é a melhor opção para o sistema de remuneração da empresa e vem ao encontro de uma das práticas mais sensatas da nossa legislação trabalhista – a lei que instituiu a Remuneração Variável (Lei no. 10.101 de 12/2000).

Apenas para concluir este artigo não posso deixar de fazer referência a outro artigo de minha autoria (“Toda implantação de uma estrutura de cargos e salários requer TOC”). Em todo esse processo que relatamos acima é fundamental a presença de 3 fatores:
T – TRANSPARÊNCIA na condução do processo
O – OBJETIVIDADE para o alcance dos resultados
C – COERÊNCIA das etapas do projeto

Vão em frente e sejam felizes !

São Paulo, Março/2012
José Francisco D´Annibale
Sócio-Diretor da R$EMUNERA Consultoria em RH Ltda.
Professor universitário INPG – Módulo de Cargos e Salários – MBA em Gestão de Pessoas